Título: Fragmentos
Autor: Caio Fernando Abreu
Editora: L&PM
ISBN: 9788525410436
Ano: 2008
Páginas: 138
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Sinopse:
Nos contos de Caio Fernando Abreu, o leitor encontrará um retrato desesperado do Brasil contemporâneo, repleto de imagens sensoriais, descritas com uma linguagem lírica e poderosa. Neste livro são apresentadas oito histórias e um conto inédito.
Resenha:
Caio Fernando Abreu é um autor aclamado pela crítica e consagrado pelo Facebook. Digo consagrado por essa mídia digital por causa da quantidade de seus textos e fragmentos que circulam por ela, principalmente entre os apaixonados. Infelizmente, boa parte está com a autoria errada, mas ainda assim é um bom parâmetro para perceber a profunda aceitação que o autor ainda tem entre o público, mesmo após a sua morte.
Por se tratar de um compilado de contos curtos, não farei um resumo sinóptico deles, pois isso cortaria toda a beleza de desbravar a obra. Ela deve ser lida como uma descoberta do autor, principalmente para quem nunca leu nada dele. Além disso, resumir um pouco da obra tiraria o principal foco dela: o sentimento. Essa não é uma obra para ser profundamente analisada, mas sentida.
Por um lado, Fragmentos traz um pouco de decepção para quem já é um profundo conhecedor da obra de Caio. Boa parte dos textos já está contida em outras obras, o que faz perder um pouco daquele brilho da primeira lida. Porém, ainda assim, é interessante para quem gosta de ter diversas obras de sua autoria, como é o meu caso.
“Só se pode encher um vaso até a borda. Nem uma gota mais” (p. 69).
Em relação à escrita do autor, o fator que mais se destaca é o lirismo. Encontramos uma linguagem trabalhada, altamente poética e metafórica, mesmo quando próxima do coloquial, o que desperta diversos sentimentos no leitor. Caio se destaca com um dos escritores proeminentes na arte de comover com a beleza da escrita e não com uma historinha triste. Suas sentenças são trabalhadas de forma que toquem o âmago do receptor do seu discurso.
Na obra, encontramos trechos sobre o amor que encanta e a falta dele que destroça; sobre decepção, a dor de estar sozinho e um pessimismo que traz um gosto de bile à boca. Seja qual for o sentimento trabalhado, a subjetividade que o autor insere em seus textos os tornam únicos. Não é um lamento de um apaixonado, é a dor travestida de discurso, de poesia.
O livro é excelente, deveras; a parte física, por sua vez, cumpre o seu papel. O livro foi formatado em edição de bolso, então temos características inerentes a esse formato. O exemplar não contém orelhas e as folhas são brancas, porém, a diagramação é confortável. Como o livro é bem curtinho também, o tamanho das letras não atrapalha a leitura. Não obstante, ainda que atrapalhasse, não seria argumento para não conferir a obra.
“– Você mudou – ele disse.– Tudo mudou” (p. 85).
Sim, a resenha ficou curta e até simples. Porém, como eu disse, essa obra não é para ser discutida, é para ser sentida. Ademais, afirmo: se você for um eterno apaixonado, vai gostar do livro. Caso seja amante da boa literatura e do lirismo em prosa e verso, como é o meu caso, certamente aproveitará cada trecho. Fragmentos tem tudo para tocar cada leitor.
Outros fragmentos:
“Olha, falta muito pouco tempo, e se eu não te disser agora talvez não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentimos uma falta enorme de todas essas coisas, e se elas não chegarem a ser ditas nem eu nem você nos sentiremos satisfeitos com tudo que existimos, porque elas não foram existidas completamente, entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão em que é permitido viver, não, não é isso que eu quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver (...)” (p. 86).
(...) fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa, de como eu olhava o relógio e andava de lá para cá sem pensar definitivamente em nada, mas não, não é isso, eu ainda queria chegar mais perto daquilo que está lá no centro e que um dia destes eu descobri existindo, porque eu nem supunha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas” (p. 91).
“Eu quero dizer que sim, que acreditei, mas ela não para, tanto tesão mental espiritual moral existencial e nenhum físico, eu não queria aceitar que fosse isso: éramos diferentes, éramos melhores, éramos superiores, éramos escolhidos, éramos mais, éramos vagamente sagrados, mas no final das contas os bicos dos meus peitos não endureceram e o teu pau não levantou. Cultura demais mata o corpo da gente (...)” (p. 95).