Elas poderiam ter saído de um livro: seus dramas, seus conflitos, seus medos; suas crenças, suas esperanças, seus amores. A coragem que as inunda e as fazem viver, entre maneiras e escolhas tão diversas, poderia ser ficção. Desconstroem-se e reconstroem-se, fazem de si matéria de estrela e suas almas transbordam espinhos, ma(i)s rosas. Elas, com suas contradições, desejos, anseios e força, poderiam ter saído de um livro. Contudo, elas saem de minha vida e entram, agora, nas suas, para lembrá-las de que o laço entre nós, mulheres, é a essência da nossa resistência e liberdade.
Ela é vendaval constante e também colo que afaga. Ela joga aos lobos, mas protege e aninha. Ela doou seus sonhos a outros e, vez por outra, ainda gera flor. Reclama e faz canção, num mesmo ritmo, num compasso constante. Não há nada como ela. E com ela é tudo ou nada. Desejo dela o tudo e, ao mesmo tempo, nada quero. Quero ser eu mesma, mas sempre capaz de repousar na existência aflita, mas cuidadosa de seu coração.
Ela é pingo e tempestade. Chove risada e floresce borboletas. Às vezes, pergunto-me como se deixou, e ainda consegue deixar, podar por alguém. Odeio assistir o arrastão de gritos que, por vezes, arrasam seu jardim. Ela resiste. Os brancos de seus cabelos são da mesma cor das histórias que têm para contar. Ela é. E parece sempre ter sido... Um estado eterno de juventude, agarrada à vida e ao sonho de sempre ser.
Elas: meu silêncio e ecolalia. A dialética imperfeita. A inconstância e a divergência. O preto no branco. Na cara. Sem rodeios. Quando paro, posso sentir-me deitar em seus corações. Sou embolada e embalada pela força das nossas risadas madrugais e da adolescência que nunca volta, porém, que permanece aqui. Vejo nelas o que fui. Vejo nelas abrigo do que serei. Serão sempre. Não há dúvidas. São o abrigo para onde sempre poderei retornar.
Força. Coragem. Entusiasmo. Tornado de uma existência. Elas não chamam. Elas arrancam. Tiram-me do meu lugar. Descompensam-me e recompensam-me com lealdade de quem sempre está. Aqui. Ali. Disponível para estar. Correm, dançam. Fazem chover. Tempestade que arrasta, muitas vezes não sabem onde vão. Mas vão. E me levam. Fazem-me enxergar no escuro. Fazem-me ter o que são: força. Coragem. Humanidade. Mergulham no infinito, parecem imensidão, incapaz de ser totalmente descoberta, mas que cobre a minha alma.
Elas são o brilho. Brilho nos olhos. Suam. Tecem. Fazem acontecer. São os olhos que refletem minhas angústias mais desenfreadas. São os sonhos que alimentam minha paixão pela educação. São e não têm o medo de ser. Não têm medo das ressonâncias históricas de suas existências. São os erros que ainda posso cometer. Elas são o alerta: chamam loucas, loucas as que vão até o fim. E que se danem eles: quero a loucura desse brilho nos olhos a me invadir.
Elas poderiam ter saído de um livro: seus dramas, seus conflitos, seus medos; suas crenças, suas esperanças, seus amores. Elas poderiam ser tantas personagens fortes, as quais eu te convido a listar. No entanto, elas são a arte viva. Hoje, convido você a reconhecê-las em sua própria existência. Ao seu lado. Em seu coração.
Eu ando sumida, eu sei.
Eu lhes devo algumas histórias, tô sabendo.
Só que, para voltar, eu precisava dizer...
Eu precisava lembrá-las de que o laço entre nós, mulheres, é a essência da nossa resistência e liberdade.
Resistamos dentro e fora das páginas.