De todas as leituras que fiz em 2016, e foram muitas, Mulheres de Cinzas foi de longe a melhor. Não foi uma leitura que marcou o meu ano, mas que marcou a minha vida. Tudo isso por que Mia Couto consegue ir além do que a maioria dos autores vai; Couto desbrava a alma humana, os sentimentos, a mente. Não obstante, também dá voz à cultura, às crenças, ao que é esquecido.
Com uma mescla de romance romântico, aprofundamento cultural e histórico e personagens verossimilhantes, Mulheres de Cinzas se torna uma obra marcante de uma maneira muito especial. Para completar, Couto ainda possui uma escrita genial e apaixonante. Voltado para o lado poético, sua prosa encanta enquanto narra, deslumbra enquanto disseca.
Há muito o que eu possa falar sobre o livro, contudo, o essencial dela não deve ser narrado, mas sentido. Então, convido-os a dar uma chance a essa obra. Você não irá se arrepender.
Em qualquer circunstância seria difícil que eu escolhesse um livro como o melhor lido, seja em um ano ou em uma vida toda. Tratando-se de 2016, essa é uma missão realmente impossível, visto que foi o ano em que comecei minhas leituras feministas e intensifiquei minhas leituras de livros escritos por mulheres. Por isso, peço licença para falar de pelos menos dois livros que marcaram, neste ano, a minha vida.
Sobre ambos os livros eu escrevi aqui, na coluna Desbravando Nós. Antes de desbravar os nós de outros, desbravei os meus próprios nós. O feminismo, por algum tempo, foi um deles. Um nó dado, principalmente, pela religião. Pelo lugar social que a mim foi, supostamente, destinado nesse mundo. Para mim, esse lugar nunca esteve certo; sempre foi questionável. Porém, os discursos nele contidos convenciam-me que era o único lugar possível: como subvertê-lo? A literatura ajudou-me a constituir um lugar meu: como pessoa singular, mulher dona de si, como feminista.
O primeiro livro que li, nessa busca, foi A mulher desiludida, de Simone de Beauvoir. No livro: três mulheres, em três novelas, em três narrativas que se encontram no medo. O medo do fracasso, do envelhecimento, da traição, da mudança de seus corpos, na desqualificação de suas mentes. Três mulheres e todas as questões machistas que circundam a todas nós, no nosso dia a dia, enquanto conversamos ou esperamos o ônibus. Enquanto crescemos. Enquanto o mundo diz o que espera de nós. Contudo, com as mulheres desiludidas nasce a subversão. A liberdade. A luta. As mulheres desiludidas rasgam-se e podem rasgar seus papéis.
Um papel, em especial, ganhou minha atenção: O papel de parede amarelo de Charlotte Perkins Gilman. Uma mulher. Um quarto. Um papel de parede. Um padrão. Alguns a chamariam de louca. Louca porque balançou as grades. Descobriu e destruiu o padrão. Fez-se livre. Não importa o quanto retoquem as paredes. O quanto reforcem o padrão. Somos livres. Nós podemos.
Essas foram as leituras que, neste ano, marcaram minha história. E sempre estarão aqui. Na minha luta diária. No sonho da nossa liberdade. Na luta por todas nós. Resistimos à história machista. Resistimos a 2016. Resistiremos sempre: juntas.
Desculpe incomodar sua leitura, mas preciso falar de Samia.
O título pode ser um pouco brega, mas a intenção é nobre e significativa. Há algumas semanas pensei em qual livro foi o mais marcante para mim dentro todos que li esse ano, defino como marcante aquele que sempre que vejo ou ouço falar dá um aperto no peito ou fico com os olhos cheios d'água e apenas um veio a minha cabeça, e só de pensar nele fiquei emocionada novamente e relembrei como foi a leitura, esse livro, essa história é de Samia, do livro A Pequena Guerreira. Peço desculpas antecipadamente por não fazer uma lista das 5 melhores leituras, mas seria pouco; tive muitas leituras incríveis e maravilhosas, então decidi falar desse livro que me mais marcou de todos os que li esse ano, e foram muitos.
Resenhei esse livro na época que estava acontecendo as Olimpíadas aqui no Rio de Janeiro, o que foi uma grande coincidência, pois o livro fala sobre a vida de uma atleta que superou todos os obstáculos para conseguir realizar um dos seus maiores sonhos: tornar-se uma atleta e um símbolo de libertação de seu povo e, principalmente, das mulheres.
Quando soube desse livro, achei que seria só mais uma história bonita e tocante, mas estava completamente errada; a história de Samia Omar é uma fonte inesgotável de inspiração. Quando souber tudo que ela enfrentou para realizar um sonho, verá que é a pessoa mais sortuda do mundo e agradecerá por viver em um país que, mesmo com todos os seus defeitos, ainda consegue ser “livre” e feliz com o que tem.
Samia me ensinou a acreditar nos meus sonhos, a ser quem eu quiser ser e conquistar o quero com minha persistência, aprender a cair e levantar com determinação e coragem, a dar valor e ser feliz com as coisas simples da vida. São tantos significados e lições que você consegue aprender em tão poucas páginas.
Para quem não conhece a história da Samia, contarei um pouquinho sobre, e direi apenas o que se encontra na sinopse e contracapa do livro, evitando assim spoilers. Samia Omar foi uma mulher que desde pequena sempre quis ser atleta, mas residia em um país repleto de violência e opressão. A Somália tinha clãs que brigavam entre si e um grupo perigoso chamado Al-Shabab, que oprimia ainda mais seus habitantes. Nossa pequena guerreira conseguiu entre todas as impossibilidades correr nas olimpíadas de Pequim em 2008; não chegou a ganhar devido à má preparação física e sem treinador, mas conseguiu chegar até o fim da corrida sendo aplaudida por todos, mas em meio a tantos feitos Samia precisou sair de sua terra e embarca na perigosa “A Viagem” e foi através dela que nunca mais voltou e foi para um lugar melhor que esse mundo.
Eu não sei como descrever esse livro sem chorar, devo parecer uma criança quando alguém fala desse livro ou quando olho a foto da Samia e vejo que ela ainda é pouco conhecida. Como falei na minha resenha, serei eternamente grata ao autor do livro, Giuseppe Catozzella, por retratar com uma grande sensibilidade e profundidade a história da Samia. Um dia espero conhecê-lo e ser capaz de agradecê-lo sem chorar.
Vocês devem achar que estou exagerando, mas não estou, acho que quem teve algum livro marcante em sua vida sabe como é emocionante e dilacerante falar dele sem afogar-se nas próprias lágrimas. Eu fico assim porque é triste ver que alguém que enfrentou preconceitos, inúmeras dificuldades e até o risco de vida para tentar realizar seu sonho e morreu lutando por ele até seu último suspiro. É assim que a imagino, ao mesmo tempo, percebo que ela se tornou um símbolo para mim e para inúmeras pessoas que reconhecem seu patriotismo como uma forma de amor e inspiração.
E como essa história não pode ser a melhor do ano? Mesmo com todas as incríveis histórias que li de diferentes gêneros que me conquistaram e me fizeram ser fã de muitos autores, nenhuma conseguiu ser tão marcante e significativa quanto A pequena guerreira. O mundo precisa de mais histórias inspiradoras como a de Samia e muitos outros heróis que vimos esse ano e que acabam no esquecimento logo depois. Em meio a tanta tragédia, violência, intolerância, preconceito e guerras, precisamos de esperança, e ela, às vezes, vem personificada em pessoas e seus atos de bondade, amor e empatia. Pessoas que lutaram por seu povo, por direitos iguais, por um mundo melhor sem individualismo e que ainda lutam sendo um símbolo para nós.
É assim que resumo meu 2016, um ano que foi preciso de muita inspiração e força para seguir em frente com a esperança nas pessoas e em um mundo melhor.
Obrigada, Samia por ser minha heroína, onde quer que você esteja, agradeço do fundo do meu coração que você consiga conquistar tantas pessoas como conseguiu comigo.
“Corra, Samia, corra como se não devesse chegar a nenhum lugar…”
Quem quiser conferir a resenha que fiz do livro segue o link:
Um feliz ano novo e que 2017 seja um ano de muitos sucessos, realizações e conquistas para vocês. Obrigada sempre pela incrível recepção e apoio ao blog <3 span="">3>