Título: Linchamentos: A Justiça Popular no Brasil
Autor: José de Souza Martins
ISBN: 9788572448918
Editora: Contexto
Ano: 2015
Páginas: 208
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Sinopse:
Linchamentos: A Justiça Popular no Brasil - O Brasil está entre os países que mais lincham no mundo. Nos últimos 60 anos, mais de um milhão de brasileiros participou de ações de justiçamento de rua. Neste livro oportuno e inquietante, o sociólogo José de Souza Martins busca, além dos motivos próximos, as raízes profundas dessa antiga prática, verdadeiro ritual de loucura coletiva.
Resenha:
Ficção é algo maravilhoso; porém, muitas vezes, é necessário ler algo que nos faça pensar, refletir sobre a realidade e nossa sociedade. Eu estava nesse momento e optei por Linchamentos: a justiça popular no Brasil. Posso afirmar, sem dúvidas, que não me arrependi. Já fazia algum tempo que eu não lia um livro com um conteúdo sociológico tão bom. Então, obviamente, precisava apresentar a obra a vocês.
José de Souza Martins, cientista social e professor titular aposentado da USP, nos apresenta uma verdade que incomoda: o Brasil é um dos países que mais lincha no mundo. E não são cem ou duzentos casos, o que já seria um absurdo; estamos falando de 2.579 pessoas linchadas nos últimos sessenta anos. É um número, no mínimo, aterrorizante.
José de Souza tenta encontrar o motivo para essa prática tão hedionda. E uma das possibilidades possíveis é que a sociedade brasileira se industrializa e se moderniza em uma superfície visível. Porém, nos cantos mais escuros do interior humano, ainda apodrecemos. Afinal, os linchamentos se baseiam em julgamentos instantâneos, superficiais e sem fundamentação lógica e legal. Sem mencionar que, muitas vezes, é influenciado por motivos raciais ou de preconceitos diversos.
“O justiçamento popular se desenrola num plano complexo. Há nele evidência da força do inconsciente coletivo e do que estou chamando aqui de estruturas sociais profundas, as quais permanecem como que adormecidas sob as referências de conduta social atuais e de algum modo presentes também no comportamento individual” (p. 9).
Outro fato mencionado na obra e que me chamou muita a atenção foi a origem do linchamento em terras brasileiras. Pouco se sabe de uma maneia mais profunda, mas tal prática começou por aqui pouco depois da época monárquica. Aliás, um dos primeiros linchados foi um homem da força policial. O motivo do seu linchamento: abrigar ex-escravos em sua residência.
Outro ponto que me agradou bastante na obra foi a profunda pesquisa histórica e fundamentação acadêmica feita pelo autor. Martins apresenta ao leitor reportagens e manchetes de jornais antigos sobre o tema, o que solidifica a base de dados apresentados. Além disso, o autor usa conceitos sociológicos bem trabalhados.
Não obstante o bom trabalho acadêmico do autor, a Contexto também fez o seu papel muito bem e preparou uma excelente apresentação física da obra para o leitor. O livro possui uma capa bonita e uma diagramação simples, porém, confortável. As páginas são brancas, contudo, como as letras são de um tamanho bom, a leitura não é atrapalhada. Tudo contribui para a boa apreciação do livro.
“Os linchamentos, de certo modo, são manifestações de agravamento dessa tensão constitutiva que somos. Crescem numericamente quando aumenta a insegurança em relação à proteção que a sociedade deve receber do Estado, quando as instituições não se mostram eficazes no cumprimento de suas funções, quando há medo em relação ao que a sociedade é ao lugar que cada um nela ocupa” (p. 11).
Diante de todos esses motivos, se torna impossível não indicar a obra, principalmente a quem procura uma boa leitura que irá acrescentar muito em sua visão de mundo. Linchamentos: a justiça popular no Brasilé, sem dúvidas, o melhor livro que eu já li sobre o tema.
Outros trechos:
“A partir do conhecimento que se tem de diferentes modalidades de linchamento em diferentes lugares do país, a hipótese mais provável é a de que a população lincha para punir, mas sobretudo para indicar seu desacordo com alternativas de mudança social que violam concepções, valores e normas de conduta tradicionais, relativas a uma certa concepção de humano” (p. 27).
“É necessário lembrar, ainda, que os linchamentos não são a única expressão de desagregação da ordem. Além dos quebra-quebras de trem e ônibus, e mais do que eles, os saques em diferentes momentos nos últimos anos indicam a proclamação moral do direto à vida e ao ter, o que contesta as condições e as regras da acumulação capitalista como ela se dá em nossa sociedade, fortemente especulativa” (p. 48).
“Em nossa tradição religiosa e cultural, a violência contra a pessoa é inaceitável. Não apenas pelas razões das leis, dos códigos, da Justiça, da polícia e dos legisladores. Já o linchamento é culturalmente aceitável como violência punitiva contra o ato violento que abreviou indevidamente a vida de outrem” (p. 121).