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Desbravando Nós: A minha estante sou eu

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A minha estante sou eu. A minha estante é o que eu fui. Ela é, também, quem estou me formando. Em breve, será quem eu me tornarei. A minha estante foi mudando enquanto me constituía gente, enquanto fazia-me pessoa humanizada, mulher dona de si. A minha estante é uma eterna construção de mim, das belezas e das angústias de minha existência.

Eu não recordo quando o primeiro livro descansou nessas simples prateleiras de madeira. Porém, estou quase certa o primeiro livro a repousar aqui foi escrito pelo Nicholas Sparks. Foi ele, com suas histórias de amor, sempre sofridas e até parecidas, que me fez sentir, pela primeira vez, uma fome literária. Antes dele, só havia livros lidos por mera obrigação escolar. Querido John, Diário de uma Paixão, A Escolha... E todos os outros, que se confundem em minha memória, fazem-me sentir um aroma de nostalgia: parece que foi há muito tempo, mesmo que não tenham passado nem cinco anos, imagino.

Depois, vieram outras releituras apaixonadas do Pequeno Príncipe e descobertas maravilhosas: A Menina que Roubava Livros, O Menino do Pijama Listrado, O Caçador de Pipas, A Cidade do Sol... Com estes, misturam-se alguns clássicos, como Senhora e O Meu Pé de Laranja Lima. Além desses, outros, que já foram morar em outras estantes, e até que vieram emprestados de outros repousos, constituíram-me e modificaram-me em diferentes medidas, por diferentes sensações.

Deleitei-me nas mais diversas escritas poéticas: de Quintana a Carpinejar, viajei. Apaixonei-me pelo poeta menino, Manoel de Barros, e repensei minhas sensibilidades com Mia Couto. Caminhei com Fernando Pessoa e rebelei-me com Galeano. Deixei de ser com eles e fui outra comigo mesma.

Não sabia, mas havia ainda mais. Muito mais. O interesse pela educação reformou a mim e a estante. Espaços abriram-se para Paulo Freire e companhia. A companhia, aliás, era boa, ainda é.  Tornei-me, e torno-me, todos os dias, um pouco mais, contadora de histórias. As miçangas e a estrelas, confesso, não sei se vieram antes ou depois.

As melhores companhias desse mergulho, porém, foram delas, das mulheres. Mulheres que lutaram por nosso lugar na literatura e onde mais quisermos estar. Simone de Beauvoir e Charlotte Perkins Gilman fizeram-me rasgar aquilo que me condicionava enquanto mulher. Fizeram com que eu pudesse enxergar-me e, assim, enxergar tantas outras mulheres que começaram a ser prioridade em minhas compras e leituras: Conceição Evaristo, Virgínia Woolf e tantas que ainda não li, porém, que estão em minha estante, em minhas listas e em meu desejo de criar laços de resistência e luta.

A minha estante sou eu, não me canso de repetir. A minha estante é o que fui, não canso de relembrar. Ela é, também, quem estou me formando; por isso, não canso de agradecer. Em breve, será quem eu me tornarei e sinto que ficarei surpresa e aliviada pela pessoa que serei. A minha estante foi mudando enquanto me constituo gente, enquanto faço-me pessoa humanizada, mulher outra, dona de si. A minha estante é uma eterna construção de mim, das belezas e das angústias de minha existência. A minha estante é Mariane. E Mariane sou eu, pronta para ser outra, sempre que a vida, e os livros mostrarem-me novos caminhos. 

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