Título: Esta terra selvagem
Autora: Isabel Moustakas
Editora: Companhia das Letras
ISBN: 8535926895
Ano: 2016
Páginas: 120
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Sinopse:
Depois de presenciar a morte da testemunha ocular de um crime tenebroso, a vida do repórter João nunca mais foi a mesma. A jovem que assistiu à tortura e ao assassinato brutal dos pais, para depois ser abusada de todas as maneiras, deu fim à própria vida diante dele após relatar cada detalhe perturbador do que vivera.
Depois de presenciar a morte da testemunha ocular de um crime tenebroso, a vida do repórter João nunca mais foi a mesma. A jovem que assistiu à tortura e ao assassinato brutal dos pais, para depois ser abusada de todas as maneiras, deu fim à própria vida diante dele após relatar cada detalhe perturbador do que vivera.
A partir deste terrível episódio, o jornalista irá seguir todas as pistas que possam levá-lo a um possível grupo racista que vem cometendo as piores atrocidades contra imigrantes, negros, judeus, nordestinos, gays e quaisquer pessoas que eles considerem impuras. Mas a única pista que ele tem são os cadarços verde e amarelo que eles usam nos coturnos.
Resenha:
Desde o lançamento deste livro fiquei curiosa demais pela leitura porque é nacional e o tema é bem diferente, assemelha-se bastante a nossa realidade e um possível futuro. Quando fechei o livro, a história ainda paira na minha cabeça. Quer saber o que achei? Confira abaixo.
Quando o jornalista João vai entrevistar uma das primeiras vítimas sobreviventes do grupo racista e homofóbico, não imaginava que seria tão traumático e difícil exercer sua função, pois cada detalhe perturbador e terrível que a jovem relatava sobre tudo o que passou nas mãos desse grupo, como foi assistir a morte de sua família, sobreviver ao cativeiro e as atrocidades que sofreu e finalmente como e porque a soltaram é estarrecedor. Para piorar, após esse relato, a adolescente comete suicídio em frente do jornalista. João acaba, por tal motivo, entrando em uma missão perigosa e difícil: encontrar esse grupo racista.
“Um dos bombeiros falara comigo sobre o cheiro de carne queimada. “A pior coisa que existe. Você não esquece nunca mais, cara. Nunca mais”. Cheiro de carne queimada. Carne humana. Ou a visão de uma garota de dezesseis anos, indescritivelmente brutalizada [...]. Você não esquece nunca mais, cara.Nunca mais”.
O suicídio da jovem parece ter desencadeado outras barbaridades e ataques a pessoas como gays, judeus, nordestinos e estrangeiros; a intolerância e ódio ficou maior e a desordem estava instaurada em São Paulo. A polícia não tinha pistas de onde vinha esse grupo e nem sobre o líder, além disso tinham que dar conta das inúmeras ocorrências que recebiam todos os dias. Aliás, essa é uma falha que observamos, infelizmente, no nosso país; cada dia que chegamos em casa sã e salva é uma conquista. As notícias que encontramos nos jornais, redes sociais, nas ruas e outros meios chegam a ser, em sua maioria, assustadoras.
João consegue encontrar pistas que levam ao possível líder do grupo, mas, infelizmente, ele não pode ser preso ou capturado por não haver provas concretas; a polícia mantém a investigação, mas, de mãos atadas, acaba sendo alvo de um propósito terrível que esses homens de coturnos planejam. Além disso, a violência continua e muitos homens e mulheres são mortos ou espancados. Não há como ler essa desumanidade e não lembrar do que lemos nos jornais ou assistimos na TV. Há como não se sentir infeliz e com medo de alguém próximo sofrer essas truculências, ou até nós mesmo?
“[...] A hora está chegando, a hora está chegando e a gente vai queimar tudo que é índio boliviano e paraíba e crioulo e viado, não vai sobrar um e depois disse que eu era, tipo, um aviso, sabe?”
A justificativa do grupo era que estavam purificando o mundo. Os impuros, segundo eles, deveriam morrer e não atrapalhar ou sujar o nome do país. Sentiam-se patriotas e estavam apenas cumprindo seu dever e faziam isso em nome do bem-estar do Brasil, começando por São Paulo; aliás, estavam apenas iniciando um grande propósito. O líder ainda achava graça do que fazia, tinha enorme prazer e ainda usava o sarcasmo de uma forma repulsiva. Não foi difícil imaginar como esse homem era.
As pistas e rastros que o jornalista encontrava o aproximava ainda mais do perigo e de ser alvo do grupo. Eu ficava com o coração acelerado nessas horas. Quando ele presenciava novas brutalidades e agressões, não conseguia ter dificuldade nenhuma de imaginar as cenas de crueldades, e cada detalhe que ele observava eu também conseguia ver, parecia tão real que, se não soubesse que era fictício, diria com facilidade que algumas dessas cenas de horror eram a nossa realidade. Algumas outras lembraram-me alguns episódios que assisti da série Hannibal e filmes de suspense/terror.
O enredo tem um ritmo muito frenético e acelerado, não explora psicologicamente sobre a vida dos personagens, é mais focado no suspense e em como são as ações do grupo racista e homofóbicos do que na forma hedionda que o ser humano é capaz de fazer as coisas e no cenário de violência que presenciamos diariamente. Até gostaria que tivesse até mais páginas, explorando mais os personagens e sobre esse grupo, como começaram e como conseguiram escapar ilesos, se tinham outras pessoas de poder ajudando-os. São inúmeras questões que ficam a critério do leitor imaginar e/ou adivinhar.
Apesar de o livro ter poucas páginas, é carregado de uma intensidade absurda e que deixava cada página mais eletrizante, tanto que só consegui largar a história após finalizá-la. Em poucas horas você consegue terminar, é aquele tipo de livro que lemos com tanta voracidade e terminamos com as últimas cenas ainda na cabeça, pensando nas possibilidades que poderiam ter sido diferentes. A única diferença entre as atrocidades e violências da nossa realidade e a do livro é que naquela lemos e imaginamos com detalhes macabros as cenas, já nesta, só ouvimos falar ou vemos as notícias e nada mais, somos poupados das minúcias.
A autora vai deixando pistas para o leitor desconfiar de pessoas que o personagem nem imaginava, e o jogo que fez para fazer o leitor desacreditar na verdade foi uma bela sacada. A autora prenunciava o final para o leitor e já o preparava com extrema tensão e revelações. Gosto muito de livros que conseguem fazer essa proeza, deixa a leitura mais intrigante e, às vezes, revoltante. Quem nunca xingou o personagem traidor ou às cenas surpreendentes?
Outra questão curiosa é que não sabemos a identidade da autora, pois o nome é um pseudônimo. Mesmo com as informações na orelha do livro, fica esse mistério, sabemos apenas que é brasileira e nada mais. Se isso é uma jogada de marketing, eu não sei, mas que estou curiosa, isso posso afirmar com certeza, quem sabe eu consiga conhecer a autora um dia?
A Companhia das Letras, como sempre, fez um belo trabalho, a capa do Christiano Menezes está incrível e reflete a ideia do livro. A revisão da Marina Nogueira e Valquíria Della Pozza ficaram excelente e a diagramação ficou confortável e adequada ao formato do livro.
Se você gosta de histórias rápidas e que faça uma reflexão sobre a nossa realidade, não pode perder a chance de conferir Esta Terra Selvagem.