Faz tempo que conheci uma menina. Uma menina com mania de filósofa. Uma menina com mania de passar os dias pensando pensamentos. Com mania de explicação. Era, finalmente, mais uma vez:
Ela gostava de inventar uma explicação para tudo que via. Para tudo que não via. Para tudo que os outros trilhavam um enorme caminho... até explicar. Mas o que é mesmo uma explicação? Ah, “é uma frase que se acha mais importante do que a palavra”.
E há algo mais importante que a palavra?
Sim. O que sentimos ao ouvir e falar cada uma delas.
Então, ela explicava. E simplificava.
Aliás, simplificar “é quando em vez de pensar em 4/8 a pessoa pensa logo em 1/2”. Talvez assim a matemática fosse mais simples, não? Um meio, além de metade, também pode ser “um jeito”. A diferença é que um 1/2 a gente escreve com números e “um meio”, com letras.
Ela sabia que cada um tinha seu jeito de explicar. Explicar não a tornava especial. O que a tornava especial era transformar explicação em canção, em bela poesia. Ouviu de muitos que tinha mania de filosofar. Irritava um bocado de gente que, ao invés de ficar pensando seus próprios pensamentos, ficava só em frente à televisão. Essa história de deixar que os outros pensem pela gente dá outro livro. Outra história, uma nada simples explicação.
Mesmo sozinha ela continuava a filosofar: “solidão é uma ilha com saudade de barco”. Onde é que eu vim parar? A saudade “é quando o momento tenta fugir da lembrança para acontecer de novo e não consegue”. Quais vontades resgatar? Vontade... ah, “um desejo que cisma que você é a casa dele”. Será que dá para despejar?
Nessa vida, há muita coisa para explicar. E ela continua tentando, não poderia mais parar. Depois a gente começa a enxergar o mundo com olhos de poesia, é mesmo assim: uma explicação atrás da outra, uma reinvenção de nós mesmo, não tem fim.
Eu aposto que aquela menina olhava nos olhos dos outros com vontade: enxergava as tristezas, as alegrias e as verdades. As mentiras, também enxergava, aposto, mesmo que não tentasse explicar. Para isso, observava a vida a sua volta, não se perdia dentro de um celular. Não tinha medo de entender o mais duro sentimento, porque sabia que a vida era isso: esse eterno movimento de se perder, não de achar.
Hoje a felicidade que não tem pressa de passar. Amanhã a tristeza, aquela mão grande a apertar. De vez em quando: raiva – aquele forte cachorro na gente, que não para de rosnar. Às vezes, amizade. E a gente lá, a se emprestar. É claro, também havia decepção e o xis bem grande em quem nos magoou. Mas também havia perdão, é o natal que, ainda em maio, chegou.
Ainda assim, depois de tanto explicar, sentiu o “nó apertado bem no meio no seu sossego”. É a angústia de, às vezes, não encontrar explicação. O amor ela não sabia ainda descrever: é um exagero? Um enxame? Um dilúvio? Um despropósito? Um desapego?
Então, eu te ajudo, menina, sobre o amor nós vamos conversar.
O amor é aquela coisa... Ah, talvez, eu também não saiba explicar.
Mas eu sei que ele nos move, que nos faz lutar. Não por alguém, o amor não é uma competição ou uma coisa, é sempre bom lembrar. O amor nos faz lutar por um lugar melhor. Isso eu sei que é amar. Um lugar em que o ódio e a intolerância não existem e não precisam de explicação.
Ah, menina... Isso ainda é um sonho. Permita-me também te falar: a utopia é aquele horizonte que se afasta, mas que faz a gente continuar, caminhar. Tentar explicar. Se perder. E quem sabe um dia... Encontrar.
Referência:
FALCÃO, Adriana. Mania de Explicação. São Paulo: Salamandra, 2013.
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