Título: Outros Cantos
Autora: Maria Valéria Rezende
Editora: Alfaguara
ISBN: 9788556520012
Ano: 2016
Páginas: 152
ISBN: 9788556520012
Ano: 2016
Páginas: 152
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Sinopse:
Numa travessia de ônibus pela noite, Maria, uma mulher que dedicou a vida à educação de base, entrelaça passado e presente para recompor uma longa jornada que nem mesmo a distância do tempo pode romper. Em uma escrita fluida, conhecemos personagens cativantes de diversos lugares do mundo e memórias que desfiam uma série de impossíveis amores, dos quais Maria guarda lembranças escondidas numa “caixinha dos patuás posta em sossego lá no fundo do baú”.
Com sutileza e domínio da narrativa, Maria Valéria Rezende vai compondo um retrato emocionante dessa mulher determinada, que sacrifica a própria vida em troca de algo maior. Outros cantos é um romance magistral, sobre as viagens movidas a sonhos.
Resenha:
Se há algo que eu admiro na literatura é quando o autor foge do lugar comum, escapa do conformismo de fazer mais do mesmo para vender e engata numa criação artística legítima que encanta. Em Outros Cantos, encontrei parte disso, o que me agradou bastante. Por outro lado, certos pontos não me entusiasmaram tanto. Quer conhecer mais sobre a obra e entender o que me encantou e o que não me agradou? Explico detalhe a detalhe logo abaixo.
Na obra, acompanhamos nossa protagonista em uma viagem de ônibus, no presente. Ela está a caminho de Olho D’Água, um local do sertão nordestino. Contudo, o foco da narrativa não é a viagem propriamente dita, mas os devaneios da autora-protagonista durante esse longo percurso até o seu destino.
Alternando entre o presente o passado, a protagonista vai lembrando, pouco a pouco, a sua primeira visita a Olho D’Água. Era uma época marcada pela ditadura civil-militar brasileira, onde as dificuldades eram constantes em praticamente todos os setores. Ao ir ao Sertão nordestino como professora, propunha-se a alfabetizar pessoas com pouco ou nenhum acesso à educação. Contudo, muito mais do que isso acontece; há uma troca bela entre educando e educador, entre forasteira e moradores, que dá certo encantamento ao livro.
“Obedeci, como vinha fazendo sem nunca me arrepender, logo aprendendo que ali só alguma humildade me podia salvar” (p. 54).
Partindo dessa premissa, que se mistura com sua autobiografia, Maria Valéria Rezende cria uma obra bela, bem escrita e com uma narrativa forte. As experiências trocadas, o cotidiano nordestino, o clima político, tudo é tratado de uma maneira altamente subjetiva e poética que prende o leitor a cada página. É possível ler uma boa obra ao mesmo tempo em que se conhece um pouco mais sobre o Brasil.
Aliás, esse é o grande trunfo do livro: permitir ter uma nova visão de um lugar que é esquecido por quase todos. O nordestino sempre foi abandonado e desvalorizado. Com a obra, vemos que tudo isso se baseia em mero preconceito mesquinho. Consegue-se enxergar a beleza da cultura local, da sabedoria popular e a poesia que só o cotidiano possui.
Por outro lado, essa mesma narrativa poética, quando é somada ao enredo altamente linear, torna toda a leitura muito vagarosa. Em certos pontos, aparenta que lemos páginas e páginas sem nada acontecer de realmente importante para a trama. Porém, isso é um mal menor dentro da beleza narrativa que é intrínseca ao livro.
“Agora o tempo é outro, repito também eu, lá dentro, a alegria do homem que volta enfim à sua terra-mãe contaminando a minha nostalgia e revivando as esperanças que embarcaram nesse ônibus. Sim, agora o tempo é outro, cheio de novos riscos, é certo, mas talvez bem mais propício à vida” (pp. 101 – 102).
Apesar de ser uma obra bela e que desnuda um pouco mais uma parte brasileira que é muitas vezes esquecida pela literatura, Outros Cantos não é totalmente original. Afinal, esse não será o primeiro e nem o último livro que mistura memórias e ficção, principalmente no período militar. Se não fosse a escrita diferenciada da autora e sua história de vida interessante, talvez a obra acabasse caindo no mais do mesmo.
Quanto à parte física, não tenho o que reclamar. A Alfaguara, selo do grupo Companhia das Letras, mostrou mais uma vez a qualidade que já lhe é padrão. Temos uma capa bonita e que carrega o tom intimista da obra. A diagramação é simples, mas bem confortável e que torna a leitura agradável. Ademais, temos uma revisão muito bem feita.
Analisando todos os aspectos apresentados, Outros Cantosé uma obra indicada por sua beleza e por mostrar a realidade de um povo que é muitas vezes esquecido. Contudo, não é uma obra que ganhará todos os leitores por causa da sua trama linear e desenrolar mais lento. Se esses dois últimos pontos não te desanimam, leia a obra; ela certamente te proporcionará uma boa experiência.