Título:Os Despossuídos
Autora:Ursula K. Le Guin
Editora:Editora Aleph
ISBN:8576573687
Ano:2017
Páginas:384
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Sinopse:
Ganhador do prêmio Nebula, em 1974, além do Hugo e do Locus em 1975, Os Despossuídos lida com temas fundamentais a sua época, como embate entre o capitalismo, o comunismo russo e o anarquismo. O romance se passa em dois planetas-gêmeos, Uras e Anarres, com sistemas políticos opostos e prestes a entrar em conflito, numa alusão à Guerra Fria.
Resenha:
Eu possuía uma profunda admiração por Le Guin devido ao seu livro A Mão Esquerda da Escuridão (resenha). Após ler Os Despossuídos, minha admiração cresceu ainda mais. Novamente, ela consegue tocar em assuntos profundos de maneira singular. Como? Conto abaixo!
Na presente obra, conhecemos Urras, um planeta desenvolvido e com dualidade política – temos uma potência capitalista e uma nação socialista forte e desenvolvida. Em Anarres, lua de Urras, encontramos um terceiro sistema: o anarquismo. Os moradores de tal lua vieram, há muito tempo, do planeta original; fugiam de um governo opressor, que matava por lucro, que escravizava por poder. Entretanto, será o isolamento a resposta correta?
Em Anarres, Le Guin nos leva a acompanhar Shevek, um físico brilhante e postulante a revolucionar a sua área de conhecimento. Entretanto, apesar de viver em uma sociedade de cooperação e concordar com seu sistema, começa a sentir falta de algo. Em primeiro lugar, há certas barreiras de poder – que nem deveriam existir – impedindo-o de ir além. Ademais, por lhe faltar um interlocutor de seu nível em sua sociedade, ele acredita que chegou a hora de Urras e Anarres finalmente voltarem a ter uma relação pacífica – talvez lá encontrasse companheiros para desenvolver a sua pesquisa. Entretanto, não é tão simples assim.
Seguindo seu sonho de união entre a sociedade capitalista e a anarquista, Shevek viaja para o centro de poder do capital a fim de conhecê-lo melhor e firmar um contrato de colaboração: ele cede seu conhecimento avançado – uma espécie de lei física geral, que permitiria a viagem interestelar com muito mais velocidade – e recebe, em troca, a cooperação entre os mundos. Contudo, Shevek é um coelho entre lobos. Quando perceber isso, pode ser tarde demais.
Partindo dessa premissa, Ursula nos presenteia com um livro bem escrito, profundo e com uma análise social sensacional. Bem escrito porque a autora consegue apresentar de maneira acessível, inteligente e muito bem delineada todo o universo político, social e funcional das sociedades. Nada lhe escapa; sob seu olhar, tudo merece um foco especial. O fato de conseguir fazer isso com uma abordagem acessível é maravilhoso, visto que o assunto tratado é complexo. Se o fizesse com termos técnicos ou linguagem mais rebuscada, certamente afastaria leitores.
Além disso, a belíssima escrita é completada pela capacidade de delinear um protagonista vívido, verossimilhante e que vive experiências realmente tocantes. Com uma construção mostrando o passado e o presente, a autora consegue aprofundar Shevek de maneira singular. Através dele, também conseguimos visualizar o melhor e o pior de cada sistema político, os sofrimentos que eles encerram aos cidadãos e como é possível se sentir infeliz e incompleto, mesmo nos sistemas mais igualitários.
Aliás, Ursula faz uma abordagem política simplesmente fenomenal da situação social, sobre todos os aspectos: economia, consumo, propriedade, liberdade, direito, felicidade... nada escapa do seu olhar crítico. Entretanto, diferente da maioria, ela não apresenta um olhar dogmatizador; como diz nosso ditado popular: pau que dá em Chico, dá em Francisco. Le Guin age da mesma maneira. Onde há problemas e dores, ela demonstra, mesmo que isso vá contra suas aparentes convicções.
Para completar, a Aleph preparou uma edição para lá de especial. A capa é bonita e chamativa; a diagramação, por sua vez, é simples, mas muito confortável. Há, também, uma tradução e revisão excelentes, proporcionando uma experiência completa. Ou seja: não há motivos para não ler essa obra.